A decisão do ministro Marco Aurélio
Mello de conceder uma liminar monocrática autorizando presos condenados
em segunda instância a pedir sua libertação caso ainda tenham recursos
pendentes de julgamento nas cortes superiores trouxe à tona a polêmica
sobre o chamado cumprimento antecipado da pena.
Desde 2009, o assunto é debatido pelo
Supremo Tribunal Federal (STF), e a jurisprudência mudou radicalmente
entre a primeira e a última votação. As decisões mais recentes, tomadas
entre 2016 e 2018, permitem que a prisão do condenado em segunda
instância aconteça imediatamente, mesmo que ainda haja recursos
pendentes. Nesta quarta-feira (19), o ministro Marco Aurélio emitiu uma
liminar contrária a essa posição. No início da noite, ela foi derrubada
por outra liminar assinada pelo ministro Dias Toffoli, presidente da
Corte.
A Constituição Federal de 1988
prevê que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado
da sentença penal condenatória”. Ou seja, o Brasil segue o princípio da
presunção de inocência. Mas a polêmica gira em torno da seguinte
questão: autorizar que uma pessoa seja presa antes que todos os recursos sejam exauridos significa negar-lhe o direito constitucional da presunção de inocência?
Até 2009, o STF não havia sido provocado para debater essa questão. Naquele ano, julgou o HC 84.078,
que tratava de um condenado por tentativa de homicídio, e, por sete
votos a quatro, decidiu que a prisão em segunda instância era
inconstitucional. A execução da pena ficou condicionada ao trânsito em
julgado do processo, tendo como ressalva a prisão preventiva.
Nessa votação, foram favoráveis ao
direito de recorrer em liberdade os ministros Eros Grau, Celso de Mello,
Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e
Marco Aurélio. Foram vencidos, defendendo a antecipação do início da
pena, os ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e
Ellen Gracie.
Novo entendimento
Sete anos depois, o pleno do STF
mudou seu entendimento. Em fevereiro de 2016, a Corte decidiu permitir o
início do cumprimento da pena a partir da segunda instância, sob o
argumento de que a regra anterior levava à impunidade.
A decisão foi novamente tomada por
sete votos a quatro. Marco Aurélio, Celso de Mello, Lewandowski, que já
haviam sido contrários à prisão em segunda instância em 2009, e a
ministra Rosa Weber foram votos vencidos. Gilmar Mendes, contrário na
primeira votação, Carmen Lúcia, favorável em 2009, Dias Toffoli, Edson
Fachin, Teori Zavascki, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux – que não faziam
parte no tribunal na primeira decisão – votaram a favor.
Em outubro deste mesmo ano, com o
julgamento de outro habeas corpus, foi confirmada a mudança da
jurisprudência. Por seis votos a cinco, o plenário do Supremo entendeu
que os condenados em segunda instância já poderiam começar a cumprir pena antes do trânsito em julgado. Toffoli mudou de voto entre fevereiro e outubro, o que explica a diferença de placar.
O tema voltou a ser assunto no STF em
abril de 2018, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
ingressou com um habeas corpus pedindo sua libertação. Novamente por
seis a cinco, prevaleceu a tese favorável à prisão antecipada. Dois
votos mudaram: Mendes voltou a ser contra a antecipação da pena. Rosa
votou a favor, argumentando que, embora fosse contra, não poderia
contrariar a jurisprudência da corte. Além disso, Alexandre de Moraes
substituiu Zavascki, morto em 2017, mas manteve o entendimento do
antecessor.
Atual presidente do STF, Toffoli marcou para o dia 10 de abril julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) sobre o tema, uma apresentada pelo partido Patriotas, a ADC 43, e outra pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a ADC 44. Nesse tipo de ação, não é julgado um caso concreto, mas sim o entendimento que se tem sobre a regra.
Com base nas declarações mais
recentes dos ministros, é provável que haja uma nova virada no
entendimento. Rosa, embora tenha votado a favor da manutenção da prisão
de Lula, declarou na sessão que votou assim porque essa era a
jurisprudência vigente, mas que, em tese, era contrária à execução da
pena em segunda instância. Se apenas ela mudar de voto em relação ao
caso de Lula, condenados em segunda instância com recursos pendentes na
Justiça não poderão mais ser presos.
por Chico Marés e Clara Becker
A posição dos ministros que, atualmente, compõem o STF
O histórico das votações
1ª votação no STF, no dia 5 de fevereiro de 2009
Por 7 votos a 4, ministros decidiram que a prisão após segunda instância era inconstitucional
Votaram a favor da prisão após 2ª instância (vencidos)
Cármen Lúcia
Ellen Gracie
Joaquim Barbosa
Menezes Direito
Cármen Lúcia
Ellen Gracie
Joaquim Barbosa
Menezes Direito
Votaram contra a prisão após 2ª instância
Carlos Ayres Britto
Celso de Mello
Cezar Peluso
Eros Grau
Gilmar Mendes
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Carlos Ayres Britto
Celso de Mello
Cezar Peluso
Eros Grau
Gilmar Mendes
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
2ª votação no STF, no dia 17 de fevereiro de 2016
Por 7 votos a 4, ministros mudaram o
entendimento anterior e permitiram que o início do cumprimento da pena
se desse após a condenação em segunda instância
Votaram a favor da prisão após 2ª instância
Cármen Lúcia
Dias Toffoli
Edson Fachin
Gilmar Mendes
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux
Teori Zavascki
Cármen Lúcia
Dias Toffoli
Edson Fachin
Gilmar Mendes
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux
Teori Zavascki
Votaram contra a prisão após 2ª instância (vencidos)
Celso de Mello
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Rosa Weber
Celso de Mello
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Rosa Weber
3ª votação no STF, no dia 5 de outubro de 2016
Por 6 votos a 5, ministros mantiveram
o entendimento de que a prisão após condenação em 2ª instância era
permitida e constitucional
Votaram a favor da prisão após 2ª instância
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Gilmar Mendes
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux Teori Zavascki
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Gilmar Mendes
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux Teori Zavascki
Votaram contra a prisão após 2ª instância (vencidos)
Celso de Mello
Dias Toffoli
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski Rosa Weber
Celso de Mello
Dias Toffoli
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski Rosa Weber
4ª votação no STF, no dia 11 de novembro de 2016
Assinatura eletrônica no Plenário Virtual
Por 6 votos a 4, o STF reafirmou a
jurisprudência, permitindo a execução da pena após condenação em segunda
instância. A ministra Rosa Weber não se manifestou.
Votaram a favor da prisão após 2ª instância
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Gilmar Mendes Luiz Fux
Roberto Barroso
Teori Zavascki
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Gilmar Mendes Luiz Fux
Roberto Barroso
Teori Zavascki
Votaram contra a prisão após 2ª instância (vencidos)
Celso de Mello
Dias Toffoli
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Celso de Mello
Dias Toffoli
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
5ª votação no STF, no dia 4 de outubro de 2018
Julgamento de habeas corpus do ex-presidente Lula
Por 6 votos a 5, ministros negaram soltura ao ex-presidente, preso desde abril de 2018, mantendo a jurisprudência sobre o tema.
Votaram contra o HC de Lula
Alexandre de Moraes
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux
Rosa Weber
Alexandre de Moraes
Cármen Lúcia
Edson Fachin
Luís Roberto Barroso
Luiz Fux
Rosa Weber
Votaram a favor do HC de Lula
Celso de Mello
Dias Toffoli
Gilmar Mendes
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Celso de Mello
Dias Toffoli
Gilmar Mendes
Marco Aurélio
Ricardo Lewandowski
Editado por: Cristina Tardáguila e Natália Leal